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Como agem os medicamentos em teste pra COVID-19

Leonardo Pereira de Lima e Juliana Mozer Sciani


Com a ascensão do novo coronavírus, tomando proporções gigantescas e quebrando sistemas de saúde em todo o mundo, foi necessário adotar medidas emergenciais e voltar aos dados já descritos sobre os últimos vírus da classe, considerados de importância clínica, e então propor possíveis medicamentos para tratar a COVID-19. Nesse sentido, foi necessário delinear um plano para estabelecer um tratamento efetivo contra o vírus, partindo de fármacos que já estão inseridos na terapêutica para outras doenças, tendo em vista a complexidade de desenvolver novos fármacos do zero.



O remdesivir é um medicamento análogo ao nucleotídeo adenosina, com atividade antiviral de amplo espectro. Ele atua se incorporando nas cadeias de RNA viral em formação, impedindo a sua replicação. Esta é uma molécula experimental que foi empregada pela primeira vez em 2016 como tratamento potencial para o ebola, porém o estudo foi interrompido em 2018 quando surgiram outras duas moléculas que apresentaram índices maiores de sobrevida aos pacientes. Junto à pesquisa contra o vírus do ebola, em 2017 foi demonstrada sua atividade contra os coronavírus que causaram centenas de mortes no passado. O estudo, apesar de reproduzir dados pré-clínicos positivos, foi descontinuado, pois os casos de MERS (Síndrome respiratória do Oriente Médio) eram muito limitados e já não havia mais infecção pela SARS 1 (Síndrome respiratória aguda grave). Atualmente correm estudos clínicos de fase 3 para pacientes com COVID-19. Neste caso, o mecanismo de ação se deve a inibição da replicase de RNA, também conhecida como RdRp, uma enzima crucial no ciclo de vida do vírus. Outros antivirais também estão sendo investigados quanto a eficácia contra o SARS-COV-2, como o lopinavir, umifenovir e ribavirina.




Um outro fármaco já aprovado e comumente empregado na clínica para malária, lúpus, artrite, entre outras doenças é a cloroquina e seu análogo menos tóxico, a hidroxicloroquina. A maioria dos mecanismos envolvidos na ação desses fármacos são pouco ou nada conhecidos, porém estudos realizados in vitro mostram alguns possíveis mecanismos sobre a nova farmacoterapia para a COVID-19.

O mecanismo proposto diz respeito à proteína de pico, proteína S, que se liga ao receptor ECA2 (enzima conversora de angiotensina 2), presente nas superfícies da membrana plasmática da célula. Esta interação promove a fusão entre o envelope viral e a membrana celular, permitindo assim a entrada do vírus na célula hospedeira e consequentemente a sua replicação. Assim, inibir a entrada do vírus na célula é um dos efeitos da cloroquina, através da alteração da glicosilação do receptor ECA2 e da glicoproteína de pico do vírus. Outro efeito que tem sido atribuído à molécula é o aumento do pH em organelas ácidas, como endossomos e lisossomos, levando ao bloqueio do transporte do vírus entre essas organelas, o que está relacionado com a liberação do genoma viral nas células. Além do que é descrito acerca da ação farmacológica da cloroquina sobre o vírus, é sabido que esta molécula possui atividade anti-inflamatória, com redução de citocinas e fatores pró-inflamatórios, o que contribui sinergicamente com seu efeito antiviral, já que uma das complicações da doença se deve a uma agressiva resposta imune frente a infecção.

Ressaltando a importância de se estabelecer a estrutura e patogênese de um vírus, torna-se possível projetar vacinas baseadas em seus componentes estruturais como potenciais antigênicos. O principal alvo para o desenvolvimento de uma possível vacina é a proteína de pico do SARS-COV-2, que pode induzir à produção de anticorpos capazes de impedir a infecção do indivíduo imunizado.


Estrutura da proteína S do SARS-CoV 2 determinada por microscopia crioeletrônica.

Além dos citados acima, outras formas de tratamento estão sendo avaliadas:

· Drogas anticoagulantes, como a heparina, agem atenuando os quadros de coagulação intravascular e tromboembolismo venoso, uma complicação recorrente da doença devido a massiva resposta inflamatória do organismo.O uso em casos graves tem mostrado uma melhora no estado respiratório de alguns pacientes.

· Anticorpos, extraídos do sangue de pessoas que já foram infectadas e se recuperaram, estão sendo testados, e o mecanismo de ação envolvido na aplicação do soro convalescente é a neutralização viral podendo envolver citotoxidade e fagocitose.

· Ivermectina e nitazoxanida, drogas antiparasitárias, e a ciclesonida, um glicocorticoide antiasmático, mostraram resultados positivos ao inibir a ação do vírus in vitro e em modelos animais não humanos.

Abaixo, outras alternativas em estudo, com possíveis mecanismos de ação contra o vírus.



Definir a farmacoterapia para a COVID-19 tem se mostrado um desafio, onde o mundo todo está empenhado em encontrar a melhor opção de tratamento. Estudos se concentram em testar milhares de moléculas com um único objetivo: padronizar um tratamento eficaz e disponível para tentar frear uma pandemia.


Referências:

CASADEVALL, Arturo et al. The convalescent sera option for containing COVID-19. The Journal of clinical investigation, v. 130, n. 4, 2020.

WANG, Manli et al. Remdesivir and chloroquine effectively inhibit the recently emerged novel coronavirus (2019-nCoV) in vitro. Cell research, v. 30, n. 3, p. 269-271, 2020.

LIU, Jia et al. Hydroxychloroquine, a less toxic derivative of chloroquine, is effective in inhibiting SARS-CoV-2 infection in vitro. Cell discovery, v. 6, n. 1, p. 1-4, 2020.

ELFIKY, Abdo A. Ribavirin, Remdesivir, Sofosbuvir, Galidesivir, and Tenofovir against SARS-CoV-2 RNA dependent RNA polymerase (RdRp): A molecular docking study. Life Sciences, p. 117592, 2020.

TANG, Ning et al. Anticoagulant treatment is associated with decreased mortality in severe coronavirus disease 2019 patients with coagulopathy. Journal of Thrombosis and Haemostasis, 2020.

Coronaviridae Study Group of the International Committee on Taxonomy of Viruses. The species Severe acute respiratory syndrome-related coronavirus: classifying 2019-nCoV and aming it SARS-CoV-2. Nature Microbiology v. 5, p. 536–544, 2020.

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